Odebrecht cometia fraude no exterior para pagar propina
O teor dos depoimentos de executivos da Odebrecht revela que a empreiteira montou um esquema de fraudes em contratos no exterior chamado setor de "geração" para abastecer as "operações estruturadas", área de pagamentos ilícitos dentro e fora do Brasil.
Segundo a Folha apurou com pessoas ligadas à investigação, mais de 90% dos recursos destinados a esse departamento de propina —que movimentou cerca de US$ 3,39 bilhões entre 2006 e 2014— foram produzidos por meio de um modelo financeiro vinculado a obras executadas em países estrangeiros.
A estratégia foi montada para evitar a operacionalização e o rastreamento dos recursos desviados de contratos celebrados com órgãos públicos no Brasil.
Três executivos da empresa, entre eles o herdeiro e ex-presidente do grupo Marcelo Odebrecht, deram detalhes deste esquema em depoimento ao ministro Herman Benjamin, relator do processo de cassação da chapa Dilma-Temer no TSE (Tribunal Superior Eleitoral).
"Nós criamos um processo onde, por planejamento fiscal —a maior parte feito fora do Brasil, em países em que você podia fazer esse tipo de planejamento, porque não era crime— nós fazíamos a geração de recursos", disse Marcelo Odebrecht.
"Esses recursos eram colocados, então, em empresas de terceiros. E alguns empresários da organização podiam se utilizar deles para fazer pagamentos não contabilizados, incluindo caixa 2, e tudo. E alguns deles se usavam disso para fazer propina", disse.
Outro delator, Fernando Migliaccio, ex-funcionário do chamado Setor de Operações Estruturadas, deu mais detalhes da operação: "Essa área considerava projetos verdadeiros da Odebrecht ao redor do mundo, onde se gerava um excedente das operações que eram oficiais", disse. "Esse excedente era usado para abastecer nossa área [de pagamento propina]."
Coube a Hilberto Mascarenhas, também delator da Odebrecht, dar um exemplo de como funcionava essa questão das obras no exterior: "Cada vez que a empresa crescia, que ganhava uma obra, em Angola, uma hidrelétrica lá, tinha bônus."
O que era o bônus? Mascarenhas explica: "Bônus, não, tinha caixa 2 lá". Ele comandou o "departamento da propina" entre 2006 e 2015.
O responsável por esse setor de "geração" era Marcos Grillo, um dos 78 delatores do grupo baiano.
No esquema detalhado aos procuradores, a Odebrecht relatou que esse departamento de geração realizava contratos fictícios com prestadoras de serviços do exterior em que reduzia a margem de lucros e impostos a serem pagos. Dessa maneira, criava um excedente de verbas que abastecia a área da propina no Brasil.
DERIVATIVOS
Mascarenhas disse que, apesar de predominante, esse não era o único modus operandi.
"Eu sei que ele [Marcos Grillo] fazia várias operações. Por exemplo, operações financeiras de comprar um determinado papel, vendia com prejuízo, prejuízo que não era real, sobrava um dinheiro fora do caixa. É uma geração de caixa 2", explicou.
O ex-executivo se referia a uma transação com derivativos (aplicações financeiras derivadas de outros valores).
Neste caso, a Odebrecht e outra empresa, em conluio, simulavam uma operação em que a empreiteira perdia e a outra lucrava.
O resultado era combinado e parte do lucro abastecia o setor de geração.
Especialistas consultados pela Folha afirmaram que em alguns países o controle de operações no sistema financeiro é menos rígido do que no Brasil, o que facilitou esse mecanismo.
Além de caixa 2, o dinheiro também era utilizado, segundo os depoimentos prestados, para quitar serviços não declarados à Receita Federal e pagar resgates de funcionários no exterior ou elevados bônus salariais.
Apesar da conexão entre as duas áreas, os setores não trabalhavam em conjunto.
"Tudo isso foi construído de uma maneira que existia uma 'chinese wall' [Muralha da China] enorme entre a área de geração e a nossa", disse Migliaccio. http://www1.folha.uol.com.br/poder/2017/03/1869761-odebrecht-cometia-fraude-no-exterior-para-pagar-propina.shtml
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